Introdução 2024: A Última das Crises

Introdução

 

2024: A Última das Crises

 

Após aquele 2005, todas as crises são sempre iguais. São como uma tempestade inesperada em um dia aparentemente tranquilo. Em meados de 2024, já era a quarta vez, em menos de dois anos, que eu me via mergulhada na mesma escuridão. A ansiedade, implacável como sempre, tomou conta de mim, e eu me rendi ao familiar frasco de clonazepam 2mg (que por vezes foram outros “tarja preta” da mesma família). Um, dois, três comprimidos... E, mesmo assim, nada. A ansiedade não cedia. Eu me tornava um vulto anestesiado, insensível ao mundo ao meu redor. Mas a quietude não durava.

 

Em um torpor inquieto, começava a discar números, enviar mensagens. Para amigos, conhecidos, grupos de whatsapp e até mesmo para estranhos. Procurava uma válvula de escape para o caos dentro de mim. Quem respondesse com qualquer sinal de irritação ou indiferença recebia de volta o meu eu mais sombrio, uma versão de mim que lançava palavras cortantes como lâminas afiadas. Eu destilava veneno, expondo o lado mais sombrio das pessoas para o mundo, como se suas falhas pudessem de alguma forma minimizar as minhas.

 

A adrenalina dessa agressividade fugaz, contudo, se esvanecia, e eu caía em um sono pesado, sem sonhos. Quando acordava, o efeito do remédio começava a se dissipar e a realidade se impunha, cruel e inexorável. Fragmentos de memória vinham à tona como cacos de vidro, e eu me via forçada a encarar as consequências dos meus atos. A culpa crescia dentro de mim, um monstro maior do que eu mesma. O que eu havia feito?

 

A empatia, que parecia ter sido banida durante a crise, retornava ao seu lugar natural, trazendo com ela uma dor pungente. Eu tentava, em um esforço desesperado, reparar o dano, pedindo desculpas, buscando a redenção. Mas as palavras ditas não podiam ser desfeitas, e muitas vezes, minhas tentativas de consertar o estrago se mostravam insuficientes. A vergonha era avassaladora, me consumia. Tudo o que eu queria era desaparecer, me esconder do mundo e de mim mesma.

 

Mas havia um consolo. Quando tudo parecia perdido, quando o peso da vergonha ameaçava me esmagar, eu encontrava refúgio no conforto enganoso da comida. Eu me entregava a ela, em excesso, como se o ato de comer pudesse preencher o vazio dentro de mim. Era um ciclo vicioso, uma dança macabra que me prendia em suas garras.

 

Essas crises eram como marés, indo e vindo, me deixando à deriva em um mar de emoções incontroláveis. Cada episódio trazia à tona as profundezas da minha ansiedade e compulsão alimentar, me fazendo questionar se algum dia encontraria a paz que tanto buscava.

 

Uma Descoberta

 

Ao escrever este livro, pude constatar que minha história não é uma ciência exata. O diagnóstico de F42.0 CID-10 é apenas um código em uma lista de transtornos psiquiátricos, uma etiqueta fria e impessoal que tenta abarcar a complexidade de uma mente em conflito. O que encontrei publicado sobre ele não corresponde totalmente à minha realidade, e talvez nunca corresponda. Decidi continuar escrevendo, deixando o final em aberto, como uma história em constante evolução.

 

A jornada de enfrentar o Transtorno Obsessivo-Compulsivo, tendo como maior desafio, hoje, a compulsão alimentar e a ansiedade generalizada é repleta de altos e baixos, de momentos de esperança e de desesperança. É como caminhar por um terreno desconhecido, onde cada passo revela uma nova peculiaridade, uma nova camada de mim mesma. E é precisamente essa incerteza que me motiva a seguir adiante, a continuar descobrindo e entendendo mais sobre mim.

 

As crises, sempre provocadas por intoxicações farmacológicas com benzodiazepínicos, são tempestades que parecem nunca cessar. Ana Beatriz Barbosa Silva, em seu livro “Mentes com Medo”, descreve como essas medicações, apesar de serem necessárias em alguns momentos, podem desencadear um ciclo vicioso de dependência e crise. Vivenciei isso em carne e osso, e foi um aprendizado doloroso.

 

Louise L. Hay, em seu clássico “Você Pode Curar Sua Vida”, fala sobre a importância de encontrar e curar as raízes emocionais dos nossos problemas. Minhas obsessões por alimentos, álcool, cigarros e fármacos, entorpecentes do passado e do presente, são mais do que meros vícios; são tentativas de preencher lacunas, de silenciar um vazio profundo e persistente.

 

Lembro-me de uma história contada por Ana Beatriz Barbosa sobre uma paciente que, assim como eu, lutava contra a compulsão alimentar. Ela descreveu como essa mulher, após anos de luta, encontrou uma saída através da compreensão de suas emoções reprimidas e do apoio de uma rede de suporte sólida. Essa história ressoou profundamente em mim, pois vejo nela um reflexo do meu próprio caminho. A rede de apoio não me falta. Entre família, médicos e grandes amigos encontro ajuda, perdão e compreesão.

 

Outro exemplo marcante é o de uma jovem que Louise Hay conheceu durante seus seminários. Essa jovem havia sofrido anos de abuso e desenvolveu uma série de compulsões para lidar com a dor. Através do trabalho árduo de autoaceitação e amor próprio, ela conseguiu transformar sua vida. Histórias como essas são faróis que iluminam meu caminho, mostrando que é possível encontrar a luz no fim do túnel.

 

Cada nova descoberta sobre minhas obsessões e compulsões é uma peça de um quebra-cabeça complexo. É um processo contínuo de autoconhecimento e cura. Aprendi que evitar que esses fantasmas do passado dominem meu futuro exige mais do que força de vontade; exige compaixão, paciência e um compromisso inabalável com minha própria saúde mental.

 

Este livro, portanto, não tem um fim definido. É um convite para que você, leitor, caminhe ao meu lado nessa jornada de autodescoberta e transformação. Juntos, podemos desmistificar os estigmas associados aos transtornos mentais e encontrar novas maneiras de viver plenamente, apesar das adversidades.

 

Como Ana Beatriz Barbosa e Louise L. Hay nos ensinam, a cura é um processo contínuo, uma jornada que exige coragem e perseverança. Espero que minha história, com todas as suas nuances e imperfeições, possa inspirar você a buscar a sua própria verdade e a não desistir, mesmo quando o caminho parecer impossível.

 

Este não é o fim, mas apenas um novo começo. A cada dia, novas páginas serão escritas, novas histórias serão vividas, e novas conquistas serão celebradas. Juntos, podemos transformar nossas vidas e encontrar a paz que tanto buscamos.

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